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A subida à montanha do Pico foi das razões que mais pesaram – senão mesmo a que mais pesou – na escolha desta ilha como nosso destino de férias durante uma bela semana neste final de Julho.
Para mim já não era novidade a subida desta montanha. Tenho bem presente na memória a duríssima subida sob condições quase extremas que fiz na companhia de mais dois amigos no dia 6 de Setembro de 2006. Nessa altura, com a fisgada de atingirmos o ponto mais alto de Portugal, embarcámos numa aventura que nos podia ter custado bastante caro. Com efeito, aquando dessa altura, as condições meteorológicas agravaram-se logo no inicio da subida, com a chuva e nevoeiro a não darem tréguas algumas. Ainda pensámos que as condições iriam melhorar perto do topo, mas ao invés agravaram-se ainda mais. Agora além da chuva e nevoeiro, este cada vez mais intenso, era o frio que nos fazia companhia. E que frio! Como já tínhamos feito grande parte da subida, arriscámos e a muito custo e sob condições de tempestade, atingimos o cume por volta das 21.30h. De nada nos valeu termos trazido tendas e demais equipamento para passar a noite na cratera, pois o vento e a chuva eram tantos que tivemos de regressar com o enorme peso às costas. A descida foi uma aventura que jamais esqueceremos…pela negativa, claro está! Felizmente estamos cá os três para contar a aventura, tais foram os perigos que tivemos de passar durante a descida, os quais incluíram várias quedas, algumas bem perto de abismos (a visibilidade na altura era quase nula) e um cansaço extremo. Três semanas volvidas e a montanha reclamava a vida de uma turista americana que se aventurou sozinha e em condições algo semelhantes às nossas.
Alguns dias depois desta aventura, e já na ilha de S. Jorge, não pude deixar de perguntar a uns quantos locais, qual seria a melhor altura do ano para fazer a subida, ou pelo menos, qual a altura em que os riscos causados pelo mau tempo seriam menores. Não me esqueço de uma frase proferida por um pescador sobre este assunto e sobre o tempo em geral nos Açores: “já os antigos diziam que dia 1 de Agosto era o primeiro dia de Inverno.”. Tive sempre presente esta frase no planeamento da próxima visita à ilha do Pico e em particular à respectiva montanha. É um facto que já tinha chegado ao cume mais alto de Portugal há bem poucos dias, mas isso não bastava: o que queria mesmo era chegar em boas condições de desfrutar de toda a subida e no cume poder apreciar toda a envolvente a 360º. No dia da partida para Lisboa, não pude deixar de ver finalmente a montanha quase despida de nuvens a fazer um apelo à sua conquista, agora já infelizmente impossível de concretizar. “Voltarei!”, pensei.
Quatro anos volvidos e regressei à ilha do Pico, agora não só como caminhante, mas também como geocacher. A viagem foi marcada para o mês de Julho, precisamente pelas razões apontadas pelo célebre pescador de S. Jorge e que me acompanharam nestes anos. Relativamente à cache, as coisas também eram algo dúbias pois os últimos logs pareciam demonstrar que esta teria alguns problemas, nomeadamente que se encontraria em más condições ou mais acertadamente que nem sequer lá estava. Neste sentido, contactámos o Pedro Cardoso, owner da cache, no sentido de levarmos uma nova para o local. Assim, com a devida autorização, preparámos um contentor estanque (lock & lock) com logbook oficial, material de escrita e alguns presentes (adicionalmente ainda lhe colocámos um TB e uma GC) para recolocarmos no GZ, caso a cache antiga não tivesse ainda sido recolocada no local por um dos guias da montanha, como estaria previsto.
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Depois de uma viagem de avião bastante calma, e em que ficámos a conhecer dois biólogos que trabalham com o Pedro e que igualmente tencionavam (se tivessem tempo depois do trabalho) subir a montanha, chegámos ao Pico no dia 27 debaixo de um calor intenso e com a montanha parcialmente descoberta a dar-nos as boas vindas. Após um dia de descanso e consultadas as previsões meteorológicas, agendámos a subida para o dia 29 de madrugada. Desta vez, faríamos ao contrário: a subida seria feita de noite (facto aconselhado por várias pessoas locais) para tirar partido da ausência do Sol e do calor intenso que nesta altura se fazem sentir na montanha. Isto dar-nos-ia igualmente oportunidade de ver o nascer do Sol e de evitar a subida das nuvens com o avançar do dia, que certamente retiraria muita da visibilidade a partir do cume.
E assim foi: despertámos às 2h da madrugada e poucos minutos depois já estávamos a caminho da estação base da montanha, a 1230m de altitude. Que diferença 4 anos volvidos: agora a estação está completamente remodelada, permanentemente habitada e todos os visitantes são obrigados a assistirem a um vídeo sobre segurança antes de prosseguirem. Contudo, a maior das novidades é que a todos os caminhantes é “dado” um GPS para os monitores acompanharem os percursos dentro e fora do trilho aconselhado, a partir da estação base. Um facto que está claramente relacionado com o acontecimento trágico de 2006.
Chegámos à estação base por volta das 3h, e cumpridas as demais formalidades (assinatura do termo de responsabilidade, visionamento do vídeo, normas a respeitar, etc.), partimos exactamente às 3.15h. O guia tinha-nos dito que se estava a prever a ocorrência de nevoeiro com alguma densidade a “meia” altitude, mas o facto é que só o apanhámos, felizmente, por breves momentos e até à cota aproximada de 1450m. A partir daí fizemos a subida integral com um céu estrelado, forrado de estrelas e constelações, e sob condições excelentes (ausência de vento). Desta vez pude apreciar toda a beleza e magnificência que o percurso encerra, desde paisagem circundante constantemente alterada pelo efeito da altitude até a visão ao infinito que a subida proporciona. As fotos que publicamos são claramente insuficientes para descrever a beleza do percurso. Não nos vamos esquecer certamente do espectáculo proporcionado pelo nascer do Sol (não foi no cume, mas mais abaixo em virtude das várias paragens para contemplar a paisagem) e pela sombra da montanha sob um autêntico mar de nuvens mais abaixo! Espectacular! Não é de facto todos os dias que estamos a pairar muito acima das nuvens e acima de nós tendo o céu como limite!
(3/3)
Chegámos ao topo da cratera por volta das 7h sob um céu infinitamente azul e estando já muito, muito acima das nuvens. Aí não pudemos deixar de notar a presença de uma tenda no interior daquela. Era de dois franceses – na altura os únicos visitantes da montanha – que posteriormente viemos a conhecer aquando da derradeira subida ao Piquinho. Encontrado o caminho certo, iniciámos a descida da cratera, agora muito mais acessível que há quatro anos atrás. Importa referir a esta parte que existem vários marcos de aproximadamente 1m de altura, colocados ao nível de todo o percurso, espaçadamente a cada 100 m de distância, e que são essenciais para a orientação. Será de todo o interesse a futuros caminhantes e geocachers, marcar a posição por GPS desses mesmos marcos durante a subida, algo que pode ser extremamente útil caso as condições se venham a agravar na descida. Uma vez na cratera, e após alguma exploração da mesma, iniciámos a navegação para o cume e consequentemente para a cache Atlantis, ali bem perto. Como se previa, a subida do chamado “Piquinho”, com aproximadamente 90-100m de desnível relativamente à base da cratera, não foi muito fácil, uma vez que a inclinação é bastante acentuada e o terreno é composto essencialmente por cascalho, pedras e blocos soltos.
Nesta fase caminhámos sempre lado a lado, a 5-6m de distância, para deste modo se evitar desabamentos de pedras sobre o parceiro atrás. A mais que ansiada chegada ao cume ocorreu às 8.15h da manhã, precisamente pouco mais de 5h depois de largarmos da estação base. A visão é algo de indescritível, fantástico e arrebatador! Algo que jamais esqueceremos! Acima de tudo e de todos, contemplámos o panorama a 360º de mar de nuvens muito abaixo de nós e a brutal dimensão da cratera em todo o seu esplendor. Perfeitamente visível era também o pico da Esperança (alt. 1035m), ponto mais alto da ilha de S. Jorge, que também conquistei aquando da expedição de 2006.
Ficámos certamente mais de uma hora no local a apreciar toda a envolvente. Aproveitámos também para conhecer o casal de franceses que tinha dormido na cratera na noite anterior e que já estava no cume antes do nascer do Sol. Ainda nos detivemos também algum tempo a explorar este peculiar cume, polvilhado de várias fumarolas bem quentinhas a sair das entranhas da terra e que por vezes tivemos de evitar para não ficarmos cozidos.
Depois de uma boa refeição mais que merecida, deixei a Cândida a gozar as vistas e fui então ali bem perto recolocar a cache nas respectivas coordenadas. A recepção de satélites é algo de extraordinária e não tardei a descobrir o GZ. Não encontrei a cache antiga como já esperava e acabei por assinar e recolocar esta nova. Recolocada a cache, fui mais uma vez apreciar as magníficas vistas do cume ali tão perto e dar-nos mais um fortalecimento de comida e bebida antes de iniciarmos a descida.
A descida foi feita de forma bastante calma, aproveitando para fotografar vários detalhes peculiares da montanha. Importa referir que, ao contrário da subida, encontrámos agora mais de 10 grupos de 10-15 pessoas (totalizando mais de 100 pessoas) que faziam a ascensão da montanha. Nesses grupos encontrámos pessoas de todas as idades – desde os mais jovens caminheiros de 7-8 anos até senhoras que deveriam ter certamente mais de 50 anos! Por momentos, a montanha parecia uma auto-estrada de pessoas de diferentes idades e nacionalidades. Fantástico! Nesta fase, contudo, a cota do nevoeiro estava já mais acima, aproximadamente a 1800m, algo que até soube bem, qual protecção para nos refrescar do calor intenso que já se fazia sentir.
A chegada à estação base, deu-se às 15h, precisamente doze horas depois da partida rumo ao cume, e com ela o fim desta aventura magnífica e grandiosa que levaremos connosco até ao fim das nossas vidas.
Um muito obrigado ao Pedro Cardoso por esta cache e sobretudo por esta memorável e inesquecível caminhada!!
In: TB+GC
Out: –
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